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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

28 DE OUTUBRO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO - 6

NEUZA MACHADO


Esta minha Epístola aos Homens do Futuro foi escrita em:

28 DE OUTUBRO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO - 6

NEUZA MACHADO


(Para o Brasileiro Consciente do Brasil-País do Futuro lembrar-se sempre que existiu um Brasil-Tristes Trópicos até o final do Século XX)

Meus amigos do Futuro Brasileiro Sem-Muro, em Meu Tempo Histórico, neste Último Domingo de Outubro do Anno de 2001 ― principalmente aqui em meu Agorá: a Cidade do Rio de Janeiro ―, cultuamos a chamada Língua Padrão. A Língua Padrão de minha realidade brasilesa segundo os especialistas deverá estar acima dos regionalismos e condizente com os mestres do idioma brasilês. Neste Final de Outubro de 2001 (não s’esqueçam das datas de minhas Cartinhas!), deveremos estar atentos à correção da linguagem e observar com acuidade os cânones gramaticais prescritos pela tradição clássica (isto se quisermos o aval de nossos censores). Nossas leis gramaticais-coloniais impõem severos castigos aos infratores. Os textos técnicos – excetuando os textos artísticos – só serão avaliados como corretos, se não apresentarem solecismos, cacografias, cruzamentos léxicos, expressões viciosas, barbarismos, impropriedades, vícios de tratamento, deformações (alterações na forma das palavras), et cœtera, etc. Assim como os portugueses (os verdadeiros donos da língua portuguesa oriunda do Latim Vulgar), os brasileses cultos são muito cuidadosos com o idioma pátrio. Até ao atual momento de nossa realidade histórica brasilesa (Mês de Outubro de 2001, não s’esqueçam!)), acreditem!, só permitimos, incorretamente, é bem verdade!, a incursão de línguas estrangeiras em nossas Ágoras. Estamos aqui sempre a adoraaaaaar outras línguas! Pois, continuem acreditando!, até este Mês Outubro de 2001, abrasilesaaaaaamos diversas palavras oriundas de outros países (principalmente, a língua oficial dos poderosos). Até agora (anno de 2001, não s’esqueçam!), estivemos a bater palmas entusiásticas para o idioma alheio, mesmo que o falante fosse um grande analfabeto em sua língua de origem, e, pior ainda!, ousamos perseguir (a Minoria Brasilesa Elitizada Que Se Diz Culta, evidentemente!), com furor!, os falantes brasileses das camadas dialetais não conceituadas. (Os que batem palmas são, principalmente, os muuuuuuto ricos da chamada Minoria Culta e Elitista; entretanto, infelizmente, os inumerááááááveis famélicos, aqueles que necessitam muuuuuuuuuuuuito mais de alimento saudável, até agora, neste Outubro de 2001, não tiveram a glória máxima de aprender Línguas Estrangeiras no Brasil Varonil).

Por esta razão, Vocês aí do Futuro estão apreendendo aqui, nesta minha cartinha do Último Domingo do Mês de Outubro de 2001, um leve tom solene e o banimento de palavras chulas e expressões impolidas. Emprego termos adequados porque, quomodo autêntica defensora de uma forma de falar correta à moda brasilesa-portuguesa, vou sempre consultar a Gramática da Língua Portuguesa Europeia, uma vez que não desejo ser admoestada por meus conterrâneos. Às vezes, consulto o dicionário de minha Brasilesa Língua Pátria e descubro que a maior parte das palavras de meu idioma provém do Latim Vulgar Vulgaríssimo. Para vocês entenderem aí no Futuro Sem-Muro, o Latim Vulgar era a forma de falar das camadas incultas de Roma.

Os soldados romanos ― aqueles que alargaram as fronteiras de Roma e impuseram o idioma latino aos perdedores ― eram todos oriundos da plebe iletrada, e foram eles, acreditem!, os iletrados e guerreiros soldados romanos, que conquistaram uma boa parte do Mundo daquela época. Meus Amigos do Futuro Brasilês Sem-Muro!, herdamos nosso idioma tão amado desses valerosos soldados romanos, os quais souberam dignificar sua Pátria de origem. Vejam Vocês!, os Povos Autóctones de um passado remoto eram obrigados, violentamente e sem compaixão!, a ceder seus espaços territoriais aos invasores romanos. Os coitados perdiam o direito de administrar seus domínios e, ainda, eram obrigados a aceitar o vulgar idioma do vencedor (ora, ora!, como vamos entender hoje, neste anno de 2001, tanta vassalagem?). Entendam, meus Amigos Brasileiros do Futuro Sem-Muro!, a nossa atual brasilesa decepção, neste Final de Segundo Milênio e Início do Terceiro, Anno de 2001: não pudemos (nós Brasileses) herdar o Latim Culto, Cultíssimo, porque os intelectuais romanos, autênticos Dictadores das Normas Gramaticais do Latim Clássico, preferiram o conforto da Urbe. Enquanto os soldados vulgares vulgaríssimos lutavam e instituíam o tal idioma deturpado, o poderio de Roma Antiga se alargava cada vez mais. Mas, mesmo assim, Graças a Deus!, quomodo Herdeiros Legítimos da Língua do Lácio, inculta e bela, nós os brasileses procuramos sempre Hierarquizar o Idioma Pátrio, talvez, numa tentativa de esquecer o Início de Nossa Trajetória Linguística Latina de Base Vulgar.

Por estas inúmeras razões, meus Amigos do Futuro!, neste anno de 2001, cultuamos a severidade linguística e não respeitamos, de jeeeeeeito nenhum! as paupérrimas camadas dialetais que não se enquadram nos pré-requisitos normativos do Bem-Falar.

Mas, os Brasileses Cultíssimos deste Anno de 2001 (apenas os ricos e cultos!, entenderam?) adoram os Idiomas Alheios!, mesmo que os falantes sejam praláde analfabetos em suas línguas de origem. Se Vocês, Amigos do Futuro Sem-Muro!, vierem, um dia, nos visitar, de volta para o passado brasileiro, constatarão o que acabo de lhes dizer: não há um canto sequer do Brasil Varonil, neste Final de Outubro de 2001, sem a contribuição de idiomas estrangeiros (visitem, por exemplo, o bairro da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro). E acreditem em mim!: para os brasileses esnobes cheirosos ricos e cultos (ou os pobres esnobes que se acreditam cultos) é uma vergonha sem limites não saber pronunciar corretamente o idioma alheio... principalmente aquele idioma, o maioral idioma desta minha época de calamidades sem conta... E, no entanto, Meus Amigos Brasileses do Futuro!, neste anno de 2001, batemos palmas calorosas para o estrangeiro rico, aquele que sabe estropiar com ou sem elegância nossa língua brasilesa inculta e bela.

Meus Caríssimos Amigos Brasileses do Futuro!, se Deus quiser, Sem-Muro! venham nos visitar! Entrem no Túnel do Tempo e retomem o Passado Brasilês (principalmente venham visitar este Anno de 2001). Este meu Presente Histórico será o Passado Histórico de Vocês. Venham informar-me o que tanto desejo saber: Vocês continuam falando o Brasilês Castiço ou já adotaram gloriosamente o Brasilês Popular?

Meus Amigos, com Muito Amor no Coração!, espero que o Brasil, aí do Futuro de Vocês, já tenha aceitado suas diversas e preciosas características dialetais, superando a terrível e comandada insegurança linguística de meu tempo histórico que o faz prestigiar, com os joelhos dobrados ingloriamente, outras línguas poderosas que não a própria. Espero que isto aconteça, pois só assim o Brasil irá amadurecer como Nação Soberana. Os diversos estratos linguísticos de um povo deveriam ser respeitados e não ridicularizados, o que, normalmente, ocorre por aqui (até esta data do Último Dia do Mês de Outubro do Anno de 2001).

No próximo Domingo (04 de Novembro de 2001) enviar-lhes-ei outras notícias. Aguardem-me! E recebam o Meu Grande Amor por Vocês e o Meu Ampliadíssimo Abraço Transecular!

ODISSÉIA MARIA, filha legítima de Antônio Aquileu e Jane Briseides, descendentes de Gloriosos Caçadores de Onças Pintadas e Jaguatiricas Noturnas de Minas Gerais, uma região incomum misteriosa e mágica situada na parte Leste do Brasil Varonil.

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