ODISSÉIA MARIA
NEUZA MACHADO
VIGÉSIMO CANTO
mas, como eu ia contando, retomando esta narrativa praláde enrolada, o Grimaldi Lines está, agora, enfeitando o Porto do Rio de Janeiro, neste 12 de janeiro de 1999, às 15h35min, horário de Verão no Brasil, na maior parte do Brasil Varonil, quero dizer, não há horário de Verão em Manaus, por exemplo, o Brasil, por ora, por enquanto, no momento, ainda é um imenso país; mas, como eu ia dizendo, o Grimaldi Lines está agora enfeitando o Porto do Rio; eu, Odisséia Egipcíaca da Média Inventiva, a anti-heroina astuciosa e andarilha em caleidoscópia peregrinação, estou atravessando mais uma vez a Ponte Rio-Niterói dos Sonhos Infinitos, no ônibus RJ-117.142, da linha Passeio-São Gonçalo, novamente em direção àquele Templo do Saber da Globalizada Cultura Pós-Moderna; e que tarde bonita, my God!; neste governo transitório do Fernando Henrique Cardoso, neste início de 1999, é muito mais vantajoso atualmente exclamar “meu Deus!” em inglês; lembre-se sempre de minhas palavras aladas, my Love!, o brasileiro de hoje não sabe valorizar o seu bello idioma, seu bello idioma herdado dos portugueses, quero dizer, com todas as nossas características idiomáticas, quero dizer; agora, novamente, em direção àquele Templo do Glorioso Saber Brasileño, o sol hiperniteroiônio ilumina todo o cenário, Apolo Luminoso das Artes e Adivinhações reina hoje no Rio de Janeiro, as barcas niteroienses atravessam a baía ensolarada, quais Brilhantes Naus dos Argivos Oriundos de Argos, vão a direção do infinito de meus Sonhos Mais Bellos, Júpiter Amante Fogoso e Dinâmico, na figura de um atlético mortal, corre atrás de Vênus Bella Fluminense, abandonou por ora a Montanha Sagrada dos Romanos Antigos, abandonou por ora as deusas de lá, e brinca feliz com as mortais de Niterói Luminosa, Júpiter e Apolo, irmanados, se banham nas águas tão tépidas do mar do Atlântico na América do Sul, Júpiter e Apolo, irmanados, disputam as bellas mortais da Cidade Imortal, as deusas do Olimpo de Copacabana vão morrer de inveja, os deuses do carioca Olimpo Praiano preferem as mortais de Niterói Fermosa da Aurora de Dedos de Rosa, a praia de Icaraí per o Mar Infinito banhada é o reduto dos deuses fluminenses, Apolo se disfarça em um másculo rapaz, Júpiter preferiu transformar-se em charmoso quarentão, agora, vejo Saturno se aproximando de mim, reconheço-o na pele de um bello sessentão, vejo tudo através de meus sonhos mais temerários; sou uma sertaneja daqui a pouco praláde cinqüentona do Século XX disfarçada de professora de literatura geral, na verdade, sou uma intelectual caipiríssima mineira, encantada!, nasci nas Montanhas Longínquas de Minas Gerais; enquanto isso, a minha Mentis Interiorizada voa até Manaus dos Caboclos Deiformes, vou na Bella e Dourada Carruagem do Sol Apolíneo até Manaus, para rever os amigos e et cœtera e tal; no entanto, não posso por ora abandonar o Grimaldi Lines, Navio Poderoso e Brilhante, tão lindo e tão branco!, enfeitando agora o Porto da Famigerada Baia Famosa; penso em levar o Grimaldi Lines para Manaus, vou levar o Grimaldi Lines para Manaus, sim senhor!, per estes ares epo-ficcionais poluídos nunca dantes navegados por nenhum Solerte Foguete Interplanetário de Carreira; mas não posso abandonar, também, o beligerante Princess Verônica da Nicarágua Cansado de Guerras, navio tão másculo com nome de mulher; não posso abandonar os navios do mundo atracados no Porto, com seus marinheiros se atracando com as mulheres da Cidade do Rio, com as mulheres prostitutas do Cais do Porto Inseguro, sedutoras; rapazes marinheiros estrangeiros fazendo filhos mestiços com as raparigas do Rio; rapariga é o feminino de rapaz, meu Rapaz!; o Milênio de Peixes já está terminando, falta um anno e meio para o milênio acabar e as profecias apócrifas não se realizaram, as profecias apócrifas não se realizarão, meu Irmão!, o mundo não vai acabar!, Você, com certeza, lerá estas minhas palavras aladas, o mundo não acabará no Anno 2000, não Senhor!!; enquanto isto, os rapazes dos navios do Mundo, aqueles navios vistosos que aportam no Rio, vão fazendo filhos mestiços com as raparigas de acá, são másculos, bonitos e reprodutores, as moçoilas sensuais não resistem a tanta macheza; nos navios, solitários!, inexiste o amor, e os solitários marinheiros sonham com as mulheres do mundo; alguns diferentes sonham com os pivetes do Rio; outros poucos ou muitos com os michês do Rio, rapazes vendendo seus corpos no Rio, para o turista brasileiro e estrangeiro no Rio, e ganham muitos dólares no Rio; e a indústria do sexo prospera no Rio, a indústria do sexo prospera no Mundo, a indústria do sexo domina o Mundo, as redes de televisão e a Internet do Mundo; e hoje as mulheres se despem tranqüilas no Mundo, as moças de família andam nuas nas praias, e os pais pós-modernos se orgulham de suas filhas peladas, e vendem a nudez de suas filhas para a Revista Playboy Americana, e ganham muitos dólares americanos, e compram apartamentos em Copacabana, e compram os automóveis mais caros do mundo com o dinheiro suado de suas filhas peladas; elas passam horas peladas posando para os fotógrafos, as dignas moças posam peladas para os fotógrafos do mundo, dignas moças, se casam na Igreja Católica e na Igreja Evangélica também vestidas de branco e de véu e grinalda, mas, há muito!, transam com os moços do Rio, ou de São Paulo, ou de outra cidade qualquer do Brasil Varonil, as dignas moças do Século XX; mas olhe só quem está atirando pedras nas dignas moças, uma insana pra lá de assanhada, aquela do tal amor milionário gatoso, para depois gastar o dinheiro em viagens homéricas, as moçoilas do Rio irão permitir?, elas querem também os velhos milionários, as velhas do Rio disputam pra valer, fazem plásticas, ginásticas, regimes e et cœtera e tal, algumas velhas ousadas se despem também e saem peladas na Revista Playboy, mas estas são velhas atrizes de grandes inventivas, ou anosas cantoras dos anos 50/60, estão acostumadas com o palco, meu Bem!; mas os velhos preferem as mocinhas fresquinhas, de vez em quando um velho qualquer se encanta per uma velha dinâmica, mas a velha tem de ser um mulheraço, cheia de charme e tesuda pra valer, se não, baubau!, agora está tudo mudado na República do Ão, os mocinhos imberbes estão de olho nas velhas, querem o “colo da avó”, outras coisas também, e o dinheiro também; mas, olhe só quem está falando, falando mal das dignas moçoilas, as moçoilas do Século XX Final,
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