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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

ODISSÉIA MARIA - IX

NEUZA MACHADO



ODISSÉIA MARIA

NEUZA MACHADO



NONO CANTO


mas, como eu ia contando, graças ao século XVI, a desarmonia passou a reinar no Mundo Rotundo; o Progresso só trouxe problemas reais; o planeta se abarrotou desde então de seres humanos robotizados demais; nesses anos finais de século XX, mais de dez milhões de pessoas só em São Paulo, a Macro-Polis do Mundo Sem-Rumo, em 25 de janeiro de 1998, em seus quatrocentos anos de vida; entretanto, eu, Calíope Justine Robotizada das Asas Quebradas Mas Querendo Voar, não saberia viver sem as coisas boas inventadas na Era Moderna, sem a Imprensa Global a noticiar os desacertos existenciais e a bagunçada política geral atual neste século final, sem a luz elétrica, o telefone celular, a televisão, o satélite americano, pré-anunciador terrificante de chuvas e lamas e vendavais, vão arrasando o Mundo os tais; eu, Odisséia Maria Guerreira do Tecido de Seda Rasgado, não saberia viver sem a geladeira, sem o fogão de gás, sem a Internet Americana das Emoções Virtuais a levar-me a todos os recantos do Mundo Sem Fundo dos Amores da Tela, bastando apenas apertar umas teclazinhas miudinhas, uns pequeninos botõezinhos, e as notícias aparecem na Tela Fantástica, notícias dos meus amigos de Portugal e et cœtera e tal, no mesmíssimo minuto, e é quomo se estivesse conversando tête-à-tête com eles; infelizmente, este método do progresso sem paz não me satisfaz, falta alguma coisa, falta o contato emocional e brigão da Era de Peixes Chorão; já estávamos habituados a um passado de Lutas Guerreiras; Acontecimentos Imprevisíveis marcaram o século da Ágora Central Barulhenta, propiciando o desejo de retorno tranqüilo ao Primitivo Isolamento; infelizmente é esta a herança do século XX para você, meu Netinho do Mundo Virtual de Amanhã!; é esta a nossa herança, total individualidade e solidão, no nosso mundo atual não existe afeto, não; só os pais amam os filhos, geneticamente somos seres evoluídos, os pais amam seus filhos, mas não há diálogo entre eles, neste final de Século XX; por isto, os filhos deste século se drogam ou se evadem para outros planos, buscam uma filosofia que os faça compreender o incompreensível, buscam o nirvana, o não-sofrimento; herança pesada!, meu Irmão!, nosso pai nos legou esta herança pesada; digo, é o sofrimento a marca do Segundo Milênio, mas não será a do Terceiro Milênio Impessoal Das Emoções Filtradas Pelo Satélite Internet; a Astrologia de hoje prevê tal marasmo no seu milênio, Amor!; os Magos Astrólogos de Hoje e do Sempre rejeitam o sofrimento; não haverá Fim do Mundo, Raimundo!, fique tranqüilo!, você existirá com certeza; o Rei do Terror não será o Marte Guerreiro da Astrologia D’Agora, será talvez um pequeno meteorito do céu caindo em algum lugar isolado da terra; ou um grande meteoro passando por perto da Terra, quase arrasando-a; ou então uma revolução atmosférica afetando alguma parte de nosso planeta; fique tranqüilo!, o Rei do Terror não o afetará em 1999 e passará despercebido; acredite em mim!, Nostradamus tinha muita imaginação, viajava muito; meus alunos afirmam que os escritores viajam!; ele era um Sagitariano Viajante do século XVI, 1503, se não me falha a memória, viajava muito em seus versos; acredite em mim, o meteorito não se chocará com a Terra; acredite!, o homem não desaparecerá no sétimo mês de 1999; talvez uns Abalos Terríveis Tenebricosos acontecerão nesta Terra Azulinda e Redonda a causar comoção; todos essas predições são pura especulação dos Incríveis Magos Astrólogos Vendedores de Horóscopo e Ilusão; estas revistas massificam-me, compreenda-me!; o que seria de mim sem as previsões diárias?, sem essas gotas mágicas em meu cotidiano agitado?; de qualquer maneira eu creio em Deus Pai Todo Poderoso, e Ele me compreende, compreende até a minha mania de horóscopo; o Anno da Besta passará e eu passarinho, assim falava o divino Poeta Quintana; palmas para as poderosas e agitadas palavras aladas, elas influenciam a humanidade sofredora do século XX; idolatrado Quintana!, conheci o Quintana em 1986 quando visitei Porto Alegre do Rio Grande do Sul do Brasil Grandalhão, quando o visitei no apart-hotel cedido pelo divino Falcão, semideus nos Campos de Futebol do Brasil Varonil e do Mundo de Então, um atleta extra-real; bondoso Falcão, aquele mesmo Magnífico Falcão Voador dos Jogos Imortais da Era Moderna, jogador de futebol da Seleção nos anos 70 deste século em questão, aquele divino Falcão, tão humano!, condoeu-se da sorte de seu conterrâneo Poeta em sua velhice, o Grande Poeta já velho e sem-teto, quase morrendo quomodo indigente seleto, se não fosse o Falcão Brasileiro; bendito Falcão!, semideus nos campos de futebol das Olimpíadas Modernas e protetor-provedor de um poeta desamparado; o poeta Quintana soube exaltar as belezas de sua cidade natal, mas estava quase esquecido, coitado!; divino Quintana!, conversou comigo duas horas seguidas, em uma tarde, quase noite, de 11 de dezembro de 1986, ao lado de sua bondosa sobrinha-guardiã; ele ofereceu-me um livro de poesias com dedicatória; Odisséia Maria das Andorinhas Voadoras das Asas Quebradas, amante dos poetas do Brasil e do Mundo, conversou com o Quintana, já surdo, gritando para ser ouvido, falando alto e gesticulando, sentado em sua cama do quarto e sala do apart-hotel do divino Falcão Brasileiro, descendente dos gloriosos deuses da mitologia dos clássicos jogos de futebol do Brasil Varonil; ele, Quintana, estava chegando de uma viagem, já cansado, mesmo assim, recebeu-me, sortuda Odisséia Peregrina em Terras Gaúchas, e falou-me longamente de seu amor pela Bruna Lombardi; a linda Bruna o fascinou, a deusa loura dos anos setenta, das novelas televisivas do Brasil Varonil; segundo suas próprias palavras aladas, Quintana um dia pensou em ser um imortal da Academia Brasileira de Letras, mas não tinha influência política e financeira para chegar até lá; ele não sabia de sua procedência divina, o Grande Quintana!; os gênios-poetas já nascem imortais, não precisam da aprovação da Academia dos Homens Mortais para se tornarem imortais, saibam todos vocês poetas do Século XX; o Quintana queixou-se das injustiças sociais; e eu sei!, ninguém vai acreditar nisso!, até parece mentira por verdade, de verdade conversei com o Quintana, guardei o seu livro e a sua dedicatória, relíquia preciosa e invendável, tive as minhas duas horas especiais conversando com um descendente dos divos imortais, hospedei-me no Hotel dos Açores dos Portugueses Intrépidos de Porto Alegre, mágica metrópole banhada pelas águas do bello Guaíba, e vi o bellíssimo Sol se deitando e as ruas mitológicas a sombra cobrindo, no mês de dezembro, acompanhando o desenho infinito da rua principal infinita, aparecendo no topo do Infinito Olimpo Porto-Alegrense ao amanhecer, quando a Aurora de dedos de rosa surgiu matutina, e findou a trajetória apoteótica, uma grande bola de fogo dos Arquétipos Primitivos, lá no finalzinho da rua, ao anoitecer, por volta das 20 horas; espetáculo bellíssimo!, magnífica apoteose solar!, o luminoso Carro de Apolo Europeu brilhando nos Céus do Brasil Varonil; depois, de volta para casa, de volta para o Futuro-Sem-Muro da América Latina, pobrezinha, tão velhinha, de ônibus, viajando de ônibus, de Porto Alegre ao Rio de Janeiro, exalando poesia por todos os poros, pensando em Quintana, velhinho, só ele e sua sobrinha-guardiã e a secretária louçã, esbelta, galante, contratada pelo Falcão Imperante; bondosa sobrinha, amando o tio sublime; quomo estará agora a sobrinha do Quintana?; eu, Odisséia Maria Guerreira Apaixonada Por Másculos e Sensíveis Poetas do Brasil e do Mundo, descendente per lado materno de Emiliano Odisseu dos Martins Sant’Annas e Romanos de Carangola e Justiniana Penélope dos Gloriosos Damásios e Amorins da Serra dos Carolas de Carangola, uma Serra Encantada vizinha de São Manuel do Boi Afogado nos Rios Eternais de Minas Gerais, Viajante do Passado Perdido Nas Brenhas do Imenso Mineiro Sertão, de volta para o futuro ladino da América Latina, à bordo de um transcendental, grandiloqüente e descomunal ônibus supersônico do imaginário-em-aberto-mimético, pensando em Carlos Drummond, divo poeta mineiro-matreiro, meu sábio conterrâneo, vivendo no Rio de Janeiro, tão pertinho de mim, mas com quem nunca pude conversar; ele nunca permitiu a aproximação de suas tietes, no meu tempo seriam chamadas de fanzocas, não sei quomo serão chamadas depois do amanhã, em verdade não sei quomodo são chamadas agora; Drummond, tão tímido e sisudo!, jamais me ofereceria duas horas de conversa, ou um dedinho de prosa, em algum esbarrão cotidiano, numa tarde ensolarada qualquer, em alguma esquina de Copacabana Esplendorosa; não!, Drummond não me ofereceria esse privilégio não; quem sou eu?, uma Odisséia Maria Qualquer!; o Quintana foi tão gentil lá em Porto Alegre!, ele era tão simples e tão humano!, Deus o tenha no Reino da Glória Hebraica, Católica e Evangélica!; ele era tão simples e recebeu a Odisséia dos Míticos Mineiros de Carangola em seu apartamento, na linda Porto Alegre do Rio Grande do Sul, a cidade do divo Rio Guaíba; agora, de volta para casa, de volta do passado, viajando de ônibus-leito, vinte e quatro horas de ônibus nas Rodovias do Sul do Brasil Varonil, venho pensando nos Poetas do Mundo Profundo e do céu cor de anil, e olho um avião passando viril, riscando os Céus do Brasil dos Cem Mil, enquanto o velho ônibus-leito-de-dormir-viajando risca o caminho que leva ao meu sonho; agora de volta per a Casa da Beira do Rio, o divo Maracanã, fico pensando, lá naquele avião o Sol Apolíneo dos Raios Alados viaja também, infelizmente, não terei o calor de seus raios em brasas, não ouvirei suas reclamações de guri mui mimado, um grande guri sonhador, produtor de etéreas palavras de amor; não!, não ousaria desacreditar desse amor!, sussurrado numa mesa do Bar Encantado, comendo iscas de peixe grelhado e bebendo guaraná gelado; quero dizer, ele tomando aguardente fervente e olhando o mar incandescente, comparando seu coração a um barco silente; envolvendo-me com palavras ardentes; falso amor oferecido; e hoje, repensando o passado sonhado, qual é o Sol Apolíneo falado?, se há tantos falantes no Mundo Azulado?

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